quarta-feira, 10 de dezembro de 2008


Sonhos. Na minha opinião, o traço mais marcante do ser Humano. Não só aqueles que falam sobre presságios e agouros. Eu gostaria de ressalvar Joseph Campbell para este texto. O homem foi uma autoridade em mitologia, e pra todo nerd, vale relembrar que o sujeito foi professor do George Lucas e ajudou a sintetizar a mitologia de Star Wars. Não fosse o Campbell a dividir os conceitos com seu aluno, teríamos, provavelmente, mais um filme engraçado sobre viagens espaciais da década de 70. Enfim, Campbell gostava de mencionar que os sonhos são mitologias personalizadas, a forma pela qual o seu cérebro encontra a chave para interpretar os abalos e sucessos na vida do indivíduo, durante o descanso. Surreal ou não, vale observar, para quem não tem o hábito, que a simbologia de qualquer sonho está dentro daquilo que cada um está passando no momento.

Esta noite, então, tive, eu, um sonho muito interessante. Na verdade, não foi BEM um sonho, algumas pessoas classificariam isso como um pesadelo, mas, acho que pelo fato de eu gostar muito de estudar o terror e o grotesco, não fiquei muito impressionado. Tratava-se de uma situação na qual eu havia ido parar, em meio a uma viagem, numa casa de uma mulher que tinha o hábito de cozinhar seres humanos, e aprisionava pessoas, forçando-as a passar fome para que, assim, não recusassem uma canja que ela fazia com o material... Fora eu, na primeira parte do sonho, haviam dez pessoas aproximadamente, todas desesperadas pedindo comida. Eu mesmo comi a comida, mas não senti nojo pois algo me dizia que era um caldo de galinha, e lá dentro, passei por um instinto de sobrevivência. Ia tentar só comer o caldo sem a carne, embora alguns pedaços – com gosto de galinha – tivessem inevitavelmente ido à minha boca.

Durante o dia, eu passava meu tempo procurando formas de avisar à polícia, pois incrivelmente, tínhamos disponibilidade pra usar celulares e internet, mas, de alguma forma, todos pareciam conformados por uma tentativa de sair mal sucedida. Um exemplo, a internet estava bloqueada para enviar qualquer informação – possível ou não, é um sonho!!! – e o rapaz lá dentro dizia que não havia conseguido quando tentou... Não digo por ele ter tentado, mas por ele ter tentado só UMA VEZ e já perdido a esperança de continuar...

O verdadeiro choque do sonho veio horas mais tarde. Todos estavam festejando. Mas desta vez era uma balada com umas cinquenta pessoas. Tinha bebida de graça e haviam deixado de lado o fato de que estávamos aprisionados na casa de uma manipuladora sádica que nos forçava ao canibalismo, fazendo seu jogo sádico espiando todo mundo se embebedar, nunca aparecendo para nos forçar em outra ocasião que não fosse a primeira vez que passávamos a comer a carne, na primeira parte do sonho. Pessoas que me foram, na vida real, amigos de duas caras estavam na festa, bebendo e me oferecendo a bebida... Logo depois, acordei...

Enfim, este post, também, é para refletir em minha posição... Acordei pensando: Nossa... tanta gente numa casa, presa por uma pessoa, e ninguém pensou em unir forças... Poderíamos ter derrubado uma parede, parecia mesmo que ninguém estava realmente querendo sair. E outra... não vi ninguém ser levado pro abate...

Ultimamente, tenho discutido muito a relação custo-benefício que as pessoas têm entre si. Hoje em dia, é muito difícil você conseguir um emprego, fazer trabalhos bem pagos, até mesmo fazer parte de um grupo social de amigos, sem conhecer alguém influente ou fazer amizade com alguém assim. Alguns chamam de “jabá”, outros de Networking. Lembrei-me do filme Tropa de Elite, onde um rapaz se aproveita do sistema corrupto pra resolver um problema na área mecânica da delegacia. Acho que a primeira parte do sonho pode se encaixar por aí. “Comer a carne humana” pode ser retratado no uso de pessoas conhecidas pra conseguir atingir certos objetivos. Isso pode parecer babaca, mas nem sempre... Quem nunca foi atrás de amigos que ajudam a conseguir algum trabalho ou conseguir mesmo um cliente forte pela amizade...Mas, por outro lado – e isso acontece em qualquer mercado – pensando que às vezes temos de lidar com educação com quem queremos mandar tomar no cu, ou precisamos cair na graça de alguém influente e babaca pra não sermos prejudicados ou ao menos conseguir certas posições, acabamos "comendo a carne humana”.

Ontem mesmo, estava eu, caminhando numa pista, dentro de um condomínio, e minha mãezinha me ensinou a cumprimentar as pessoas. Haviam dois homens vindo em minha direção. No momento em que ficamos de frente, balancei a cabeça e levantei a mão em cumprimento. Os dois só ficaram olhando pra mim com aquela cara de “por quê ele tá me cumprimentando?”. Já tive, também, situações em que fui convidado a levar minha banda pra tocar em um lugar e o cara foi extremamente babaca. Não mandei ele à merda, porque é fato: Bom cabrito não berra. Arranjar um inimigo de graça é idiotice. Amanhã ele pode ferrar você ou te dar uma chance pela sua educação (NOT!!).

Enfim, a segunda parte do sonho, é interessante, porque eu me encontrei sozinho tentando resolver o problema, mesmo sabendo que era uma enorme casa. Muita gente praticamente hospedada. Me lembrou o comodismo das pessoas. Elas sabiam que estavam num mundo cheio de problemas nocivos e grotescos, mas a coisa tava tão fácil lá dentro, que sair ou não era uma questão de disposição. Ninguém estava realmente afim de sair, mas ninguém queria admitir. Acho que é o inverso da primeira situação. A gente se encontra numa posição em que quer mudar essa linha de pensamento e acaba vendo que as pessoas se acomodam. "Foda-se que a gente come carne humana... o que vai ser diferente lá fora? Aqui, ao menos é seguro..."

No fim, trata-se daquele comodismo do dia-a-dia. Todo mundo quer mudar, arranjar um emprego legal, criar novas possibilidades, abrir portas... mas no fim, requer muito trabalho e é mais fácil deixar como está... Coisa que me deixa PUTO. Minha banda, novamente, demorou um ano pra formar-se com músicos bons, e no meio-tempo, tive de lidar com situações em que um dos músicos ocasionais, via que tinha problemas pra conseguir alcançar um objetivo difícil, e, ao invés de tentar, ou mesmo se justificar por não sentir-se capaz de ajudar-nos – já que cada um inquestionavelmente tem seus limites – o sujeito simplesmente sumia. Vez por outra, ainda falava pra alguém, que era a gente que não tinha mais chamado o infeliz. Onde tá a responsabilidade dessa gente? Acham que não ligar mais é como se os problemas sumissem. Como uma criança que pensa que tudo o que ela não vê, não existe... Alcoólatras, drogados, e tudo mais, sempre a mesma coisa... Você coloca a pauta, ela é tão desconfortável, que eles acabam fugindo e te recriminando por isso...

E por último, a terceira e última parte... A festa. Meu Deus. Neste caso, tudo já está tão normal, que agora temos muita gente comendo a carne humana, e a coisa é tão boa, que eles tentam TE acomodar. A única pessoa da casa que achava repulsivo e desesperador ficar no meio daquela gente era eu. E incrível, uma pessoa que conheci, um amigo falso que tive, me oferecendo bebida. Não preciso dizer muito, neste caso. Aqui, não é mais evitar, é afirmar que o comodismo é o caminho. Tapar o sol com a peneira.

Vemos isso desde o filho que não quer trabalhar enquanto recebe mesada, até o telejornal , que mostra notícias absurdamente comoventes pra bloquear nossa atenção do que realmente acontece... E isso não é Brasil. Isso é um mundo de pessoas abraçando essa religião do comodismo... E sempre com aquele provedor da carne, que não come dela, mas faz de tudo pra você não se importar que é ele que manda no jogo e você o condenado a morar ali. Preso na sua “felicidade”, e com medo de um mundo livre e cheio de possibilidades!

Obs.: Se curtiram esse texto, e gostam de ler, Leiam “Dragões Não Conhecem O Paraíso” de Caio Fernando Abreu. Pode ir direto ao cap. XIII, o último

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